Solidão a Dois

Não há pior sensação do que a da solidão acompanhada. O outro está , fisicamente, a um passo de distância e, psicologicamente, é como se vivesse noutro planeta. Refiro-me a todos aqueles que arrastam situações em que a solidão está sempre presente.
Muitos casais vivem vidas completamente separadas, em termos de afecto. Não constituem, de modo algum, um casal no sentido em que todos fomos ensinados, mas sim uma relação que é muito mais comercial que outra coisa. O casamento não passa de um contrato de prestação de serviços, factuais, mas não afectivos. Dividem casa, despesas, espaço físico. Cruzam-se diariamente, num encontro, fugaz e frio, de fim de dia. Jantam em frente à televisão, porque deste modo evitam dialogar. Dormem na mesma cama. Fazem sexo (não amor) de vez em quando, porque a fisiologia assim o manda. E os dias repetem-se com a mesma cadência.
Nas situações sociais apresentam um sorriso nos lábios, como se quisessem enganar o mundo (já que se enganam diariamente ), mostrar uma felicidade que há muito deixou de existir. Decididamente são adeptos do “mais vale mal acompanhado que só”, porque raramente têm coragem para colocar um ponto final. As mulheres refugiam-se então nas compras, tomam ansiolíticos ou então fazem cirurgias plásticas. Adormecem o desejo, anestesiam o prazer. Tentam mudar por fora já que não conseguem mudar internamente.
Os homens apostam na carreira profissional, jogam golfe aos sábados e combinam jantaradas com os amigos. Pelo meio, ambos vão coleccionando flirts. Eles mais do que elas, talvez porque socialmente é mais aceitável que assim seja. Lá encontram afecto, surpresa, aventura... tudo o que não têm com aquela pessoa que vive lá em casa. O afastamento emocional é brutal. Não há nada que os una, a não ser os bens materiais.
Enquanto são pequenos, os filhos servem de excelente desculpa para tudo se manter inalterável. À medida que vão saindo de casa, instala-se o vazio. Depois defendem-se dizendo ser tarde de mais para mudar de vida. Há uma boa casa de praia, um bom carro, dinheiro no banco ... felicidade não existe mas, o que é a felicidade ? Quem nunca viu o mar também passa sem ele, não é verdade ? Tudo é preferível a ficar sozinho ...
Mais vale mal acompanhado que só ...
Neste processo a auto-estima acaba por ser a mais castigada
Contrariando o dito popular, este é o lema de muitas pessoas.Assim, vão coleccionando romances atrás de romances, o que não passa de uma tentativa desesperada para preencherem um vazio interior, que por sua vez aumenta cada vez mais.
Na nossa sociedade, chegada a uma determinada idade, é suposto ter namorado e quem não tem é com muita dificuldade que consegue gerir esta situação. Assim, como forma de a contornar, entregam-se de corpo e de alma ao primeiro que aparece.
Acreditam que se trata de uma grande paixão, que desta vez tudo vai dar certo e a felicidade por fim chegará. Contudo, os amores à primeira vista conduzem, com alguma frequência, a grandes paixões mas a pequenos amores.
A paixão assenta em componentes de atracção puramente física que não sendo complementada com um encaixe emocional, não irá dar em nada. É uma energia, um estado de alma superficial, que facilmente se desvanece. O que muitas vezes acontece é que, de modo inconsciente, projectamos no outro tudo o que idealmente gostaríamos de encontrar em alguém.
Claro está que, entre o desejo e a realidade, há uma enorme distância, pelo que, passados os dias ou semanas iniciais, a realidade entra em choque com a fantasia e surge a desilusão. Perante a desilusão, e face à incapacidade de estarem sós durante algum tempo (mais que não seja para elaborar o que aconteceu e perceber o que há a mudar na atitude) ,surge a necessidade imperiosa de encontrarem outro alguém.
Neste processo, a autoestima acaba por ser a mais castigada. É que, tal como o povo diz “elas não matam mas moem”e persistem sempre sequelas emocionais que se vão acumulando. Vão ficando com a ideia de não serem suficientemente bons, por forma a serem capazes de manter e construir uma relação sólida e saudável.
Esta sensação fá-los agir e viver numa roda viva de festas e saídas à noite, cujo objectivo último consiste em procurar alguém que rompa este circulo e corresponda aos seus sonhos.... mas que sonhos ?
É que quando questionados, não sabem muito bem o que procuram, nem tampouco o que desejam. Ao longo da vida, agradam-lhes pedaços de pessoas, nunca toleram o todo, o que lhes traz um permanente sentimento de incompletude.
O pior é que são pouco receptivos à mudança e dificilmente admitem ter um problema. Afinal de contas, existe sempre alguém disponível para servir de companhia e, estes “seres errantes” desenvolveram a faceta de sedução o que lhes confere um encanto especial.
Transmitem então a ideia de estarem de bem com a vida, de possuírem muitos e bom amigos e melhores namorados/as. O que poucas pessoas percebem é que, por detrás desta máscara de sucesso a nível social e emocional, se esconde uma profunda solidão a que, por todos os meios, procuram fugir.


