Repetir Erros
Caem consecutivamente nos mesmos buracos do passeio da vida, somam feridas ao nível da autoestima, que mais tarde se transformam em cicatrizes profundas, que os impedem de avançar.
Há um conto tibetano que é mais ou menos assim:
“ Levanto-me pela manhã / saio da minha casa/há um buraco no passeio/ não o vejo e caio nele /No dia seguinte/ saio de minha casa procurando recordar-me do buraco no passeio/ recordo-me e, apesar disso, não vejo a cova e caio nela. / (...) Ao sétimo dia/ saio de minha casa/ vejo o buraco/tomo impulso/salto/chego ao outro lado! / Sinto-me tão orgulhoso por o ter conseguido/que o celebro dando saltos de alegria …/ e ao fazê-lo, caio outra vez no buraco. / (...) Ao décimo dia/ hoje precisamente/ dou-me conta, de que é mais cómodo caminhar… pelo passeio da frente.”
Quantas e quantas vezes fazemos isto ao longo da vida? Apesar de sabermos que estamos a agir erradamente, vamos repetindo comportamentos até à exaustão. Insistimos em manter relações condenadas ao fracasso, mantemo-nos em empregos frustrantes, investimos em amizades com pessoas que pouco ou nada, ou nenhum afecto têm nos para dar... tudo isto se repete dia após dia, como se fossemos acometidos de uma espécie de cegueira que nos impede de encontrar caminhos alternativos.
De algum modo, a mudança assusta a todos. Mudar implica deixar para trás caminhos já conhecidos, e aventurar-se pelo desconhecido. Por isso mesmo, muitas pessoas se deixam estar. São incapazes de dizer “basta!”, mesmo quando se sentem insatisfeitos ou infelizes com o que quer que seja. Caem consecutivamente nos mesmos buracos do passeio da vida, somam feridas ao nível da autoestima, que mais tarde se transformam em cicatrizes profundas, que os impedem de avançar.
De vez em quando lá têm um rasgo de coragem e rebelam-se, mas rapidamente baixam os braços e voltam a trilhar os mesmos percursos. Um dia, quando pouco lhes restar ao nível da autoestima, hão-de questionar-se porque não foram capazes de proferir um “ NÃO!” na hora certa. Ao efectuarem um balanço da vida que tiveram, hão-de concluir que sempre se contentaram com os “suficiente” e nunca sequer aspiraram a um “bom” ou “muito bom”.
Acabarão por perceber que muitas relações afectivas que mantiveram foram decalcadas umas dos outros, sem que tivesse havido qualquer evolução positiva que os gratificasse. Vão dar-se conta que não fizeram, nem tiveram, nada daquilo que desejaram por pura cobardia. Mas... Será que custa assim tanto levantar a cabeça e olhar um pouco mais para além do nosso horizonte?
Juramos que esta foi a ultima vez mas … mudar comportamentos e atitudes é muito complicado, porque implica mexer com muitos factores internos
Quantas vezes sentimos que as coisas más só acontecem porque nós o permitimos, ou nos “colocamos a jeito” ? De facto, uma das mais-valias da maturidade, é adquirirmos um certo capital de vida, que nos permita ver para além das fachadas, descortinando intenções camufladas.
Esta capacidade possibilita a criação de determinados mecanismos de defesa, que nos protegem das desilusões. Claro está que só vivendo poderemos adquirir esta experiência. E viver acarreta riscos. Quanto a este ponto não há muita volta a dar. Contudo, existem pessoas que tendem a não aprender com os erros. Repetem os mesmos caminhos até à exaustão. Não analisam as situações à luz de outras que, sendo análogas, acabaram por correr mal e trazer consigo a desilusão.
De certo modo, parece que se posicionam na vida sempre de determinada maneira. Tudo fazem para serem magoados, quase como se vivessem numa roda gigante que volta sempre ao mesmo sítio, repetindo desnecessariamente as mesmas histórias, vezes sem fim.
Mas, se estivermos bem atentos, poderemos perceber que não são as histórias que se repetem, mas sim o modo como as pessoas a escrevem. Isto é, se colocarmos num pauta sempre com as mesmas notas, resultará daí uma melodia necessariamente semelhante, ou mesmo igual… com a vida sucede exactamente o mesmo. Por exemplo quantas vezes pensamos não mais voltar a emprestar livros, pois em regra não nos são devolvidos ?
Ou em deixar de ser tão permissivos com alguns amigos, porque isso nos prejudica. Certo é que, depois de nos indignarmos, de jurarmos não mais cometer erro semelhante, tudo acaba por voltar ao mesmo. Perante o facto consumado, levamos as mãos à cabeça e perguntamo-nos como foi possível. Acabamos por entrar numa espiral de culpa. Sentimo-nos ludibriados, magoados com a vida e com as injustiças que ela permite. Depois da “poeira assentar”, percebemos que, no fundo, no fundo, fomos nós que permitimos que tudo aquilo acontecesse ou seja … colocámo-nos mais uma vez a jeito!
Volta, então, tudo ao princípio. Juramos que esta foi a ultima vez mas … mudar comportamentos e atitudes é muito complicado, porque implica mexer com muitos factores internos. O primeiro passo consiste em tomar consciência dos actos, e só depois se pode trabalhar no sentido da mudança.
A evolução faz-se com passinhos pequeninos e inseguros. Umas vezes progride-se, outras tropeça-se, no longo caminho. Mas, com muita insistência, chegará o dia em que deixamos de estar lá, permanentemente, no mesmo sítio, com os mesmos gestos, com as mesmas posturas. Mudamos… e então deixa de dar jeito que os outros nos continuem a magoar…