POR UMA VIDA LONGA E SAUDÁVEL

15/01/2012 16:51

Comemorar os 100 anos já não é mais privilégio dos orientais. Agora, especialistas tentam desvendar os caminhos para se chegar lá, com o máximo de vigor e lucidez
 

 

 

20 anos: a fase ideal para começar a investir na saúde

Por muito tempo, no inconsciente coletivo, a imagem do felizardo que conseguia viver (e ter fôlego) para apagar 100 velinhas no bolo de aniversário era uma só: a de um senhor (ou senhora) simpático, de 'olhinhos puxados', adepto de uma alimentação natural e praticante de tai chi chuan, ioga ou qualquer outra arte milenar capaz de equilibrar o corpo e a mente. Graças ao aumento mundial da expectativa de vida e aos vários avanços da medicina, no entanto, ter a chance de presenciar o crescimento dos tataranetos ou as conquistas de uma geração inteira deixou de ser apenas privilégio dos orientais.

O planeta todo está com os cabelos brancos. A maioria dos centenários ainda vive no Japão e, juntos, somam 20 mil. Mas, assim como na terra do sol nascente, mulheres e homens com mais de 60 anos já ultrapassam o total de crianças na Bulgária, Alemanha, Itália e Grécia. Por aqui, segundo dados do IBGE, o número de brasileiros com 80 anos ou mais, que em 2000 era 1,8 milhão, aumentou e deve chegar a 13,7 milhões em 2050. É no Brasil, inclusive, que pode ter vivido o ser humano mais velho de que se tem notícia: a ex-escrava Maria do Carmo Jerônimo, moradora de Itajubá, interior de Minas Gerais, que morreu em 2000, aos 129 anos! Por falta de documentação, a façanha não foi registrada no Guiness Book, o livro dos recordes, e, oficialmente, a marca ainda é da francesa Jeanne Louise Calment, que viveu 122 anos até 1997.

O envelhecimento global é fato e, antes que muita gente notasse um familiar prestes a completar um século de permanência na Terra, o fenômeno já havia chamado a atenção dos cientistas. Os mistérios que envolvem nascimento, amadurecimento e morte do ser humano, aliás, sempre tiraram o sono dos pesquisadores. A diferença é que, agora, o objetivo não é descobrir formas de garantir ao máximo a sobrevivência da espécie. Com técnicas de saneamento básico, a tecnologia na produção de alimentos, a vacinação, entre outras evoluções e descobertas médicas (dos antibióticos até o coquetel anti- Aids), já é possível para as crianças nascidas na era da Internet viverem bem mais do que seus avós.

 

"Nunca fumei nem tomei bebidas alcoólicas. E, aos 48 anos, para curar um problema de má circulação, comecei a me exercitar. Hoje, faço hidroginástica, caminho todo dia e nado três vezes por semana. Já fui seis vezes campeã paulista de maratonas aquáticas em águas abertas e, aos 67 anos, fiz uma travessia de nove horas (42 km) no mar de Bertioga. Nem os remédios que preciso tomar para tratar uma disfunção da tireóide me deixam desanimada. Dizem que pareço ter 20 anos a menos, e é exatamente assim que me sinto. Se pudesse voltar atrás, teria abandonado a vida sedentária muito antes"

Olga Arsuffi, 70 anos, proprietária da Academia de Ginástica e Natação Atlantis, de São Bernardo do Campo (SP)


caminhos abertos pelo GENOMA
 


Geneticistas, bioquímicos e biólogos moleculares unem esforços para ligar pelos menos três descobertas ao processo de envelhecimento e tentar extrair os mecanismos necessários para controlar os desgastes naturais. São elas:

RADICAIS LIVRES: substâncias tóxicas formadas a partir de reações com o oxigênio. Até 5% delas no organismo não causam estragos e inclusive ajudam a eliminar bactérias intrusas. Em excesso, provocam danos às estruturas internas das células e redução em sua capacidade de produzir energia. Chamado de oxidação, este é o envelhecimento celular, responsável pelo aparecimento de uma série de distúrbios e doenças. "Conseguimos provar o quanto vários tipos de radiação, incluindo a emitida por luzes fluorescentes, contribuem para produzir radicais. Em contrapartida, já se sabe que alguns alimentos possuem substâncias antioxidantes, como vitamina E, capazes de barrar boa parte dos estragos", revela a bioquímica Nelci Fenalti Hoehr, da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Campinas (Unicamp), que trabalhou no Instituto Nacional do Envelhecimento (NIA), em Baltimore, Estados Unidos.

TELÔMEROS: essas minúsculas estruturas de nome estranho foram a descoberta mais relevante dos últimos oito anos. "Presentes nas extremidades dos cromossomos, onde está enrolado o código genético (DNA), previnem fusões, recombinações, degradação ou perdas de seqüência durante as divisões celulares", explica o geneticista Sérgio Pena, da UFMG. Cada vez que uma célula se divide, os telômeros vão ficando menores e encurtando até acabar, gerar uma instabilidade genética e, conseqüentemente, levar à morte celular. Hoje são vistos como um relógio molecular para o envelhecimento. Pesquisa coordenada por cientistas da Universidade de Utah (EUA), por exemplo, comparou amostras de sangue de 143 pessoas de 60 anos e concluiu: aquelas com telômeros maiores têm menos chances de desenvolver doenças do coração e vivem de quatro a cinco anos mais. Agora, os cientistas buscam uma forma de evitar o encurtamento dos telômeros. Durante essas tentativas, já tiveram uma surpresa. Somente algumas células, como as que formam os tumores, conseguem preservar essas estruturas. Por isso, elas jamais param de se multiplicar. Isso também explica por que estudiosos alertam a população para a frágil linha que separa a tentativa de estender a vida com o aumento dos riscos de câncer.

REPOSIÇÃO HORMONAL: com o envelhecimento, o organismo deixa de produzir certos hormônios (necessários apenas à fase de crescimento e reprodução). Por isso, alguns cientistas defendem prolongar a atuação dessas substâncias na terceira idade para 'manter a juventude'. A fim de amenizar os efeitos da menopausa, por exemplo, as mulheres recorreram a doses de estrogênio e progesterona. Agora, a mania são injeções de hormônio do crescimento (o GH), com o objetivo de intensificar o vigor e a força muscular. Pesquisadores escoceses anunciaram também que a ingestão diária de uma pílula do hormônio tiroxina (produzido pela glândula tireóide), pode aumentar em até 30 anos a vida média das pessoas. As opiniões, no entanto, ainda estão divididas, até porque indícios sugerem que as reposições possam elevar os riscos de câncer, ataque cardíaco e osteoporose.

 

 

Segundo os resultados de estudos nacionais e internacionais com grupos de pessoas centenárias, 25% da longevidade dependem da qualidade e funcionamento dos genes. Boa parte da responsabilidade (os outros 75%), no entanto, recai sobre o estilo de vida e, portanto, está em nossas mãos. Prova viva disso é o participante mais longevo do Pensa (Núcleo de Pesquisa em Envelhecimento Saudável), da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Há 107 anos (comemorados no mês passado), e com uma saúde que considera excelente, ele não cansa de dar a mesma resposta quando perguntam sobre seu segredo de vitalidade: "Eu me alimento de maneira saudável, caminho todos os dias, durmo o suficiente, tomo umas cervejinhas de vez em quando com os amigos, faço o bem e mantenho o bom humor".

"Envelhecer bem não significa chegar aos 100 anos sem nenhuma doença crônica - isso é utopia -, mas estar preparado para enfrentar as perdas funcionais da melhor maneira possível", alerta o geriatra Luiz Roberto Ramos, do Centro de Estudos do Envelhecimento da Unifesp, que há cerca de 15 anos acompanha a evolução de um grupo de idosos do bairro de Vila Clementino, em São Paulo. E, para se ter idéia, o mais novo da turma, hoje, está com 80 anos. Na prática, um idoso pode tomar vários remédios para conter pressão alta e diabetes, por exemplo, e ainda assim ser considerado saudável. "Tudo dependerá de sua qualidade de vida. Quanto mais ele investir nisso, maior será o seu controle sobre os sintomas e a sua força para seguir a rotina, sem depender de ninguém", explica o especialista.

 

 

Teste
 

QUANTAS VELINHAS VOCÊ CONSEGUIRÁ APAGAR?
O teste abaixo é uma adaptação de questionários que relacionam genética, qualidade de vida e longevidade, oferecendo apenas uma idéia da idade que você poderá atingir, tendo em vista seus hábitos cotidianos. Imagine-se com 72 anos (a expectativa média de vida dos brasileiros), leia cada tópico e faça as contas.

SE VOCÊ...
PONTUAÇÃO (COMECE COM 72)
Vive bem humorado, é otimista
+ 5 anos
É pessimista e mau humorado
- 5 anos
Tem alguém na sua família com 90 anos ou mais
+ 10 anos
É totalmente sedentário
- 5 anos
Faz atividade física apenas eventualmente
- 2 anos
Exercita o cérebro com freqüência (lê, joga xadrez, estuda)
+ 5 anos
Mantém uma dieta leve e balanceada, com baixas calorias
+ 7 anos
Alimenta-se de forma inadequada (gorduras, frituras, doces)
- 7 anos
Está fora do peso normal
- 1 ano
Encontra-se em boa forma
+ 3 anos
É fumante
- 5 anos

OBS: Se você tem mais do que a idade recomendada para iniciar o teste, não importa. Faça as contas com 72 anos e, no final, compare com a sua idade atual.

 

Com autonomia é melhor
Um outro estudo, desenvolvido pelo Pensa, com longevos da cidade de Juiz de Jora, em Minas Gerais, apresentou índices que comprovam a importância dos bons hábitos e das atitudes para uma velhice mais saudável: 72% nunca fumaram, 81% jamais consumiram bebidas alcoólicas, 51% praticam atividade física pelo menos uma vez por semana, 68% têm sempre alguém para conversar ou recorrer quando necessitam e 31% saem semanalmente com os amigos. Resultado: 94% deles apresentavam apenas uma ou duas doenças crônicas, mas demonstravam autonomia e independência. De acordo com as psicólogas Neide Cordeiro de Magalhães e Kelly Cristina Atalaia da Silva, coordenadoras da pesquisa do Pensa, aspectos emocionais, culturais e sociais contribuíram significativamente para que esses idosos tivessem uma expectativa de vida que beira os 78 anos, superando a média nacional. E você, até onde vai chegar?

 

 

PARA CHEGAR LÁ
 
Confira os hábitos mais importantes para envelhecer bem e algumas razões para não esperar até os 60 para adotá-los.
REDUZA AS CALORIAS: uma equipe de pesquisadores americanos examinou alterações no fígado de ratos e identificou 46 genes que passaram a funcionar de forma diferente à medida que os animais envelheciam. Ao mudar a alimentação das cobaias, no entanto, eles conseguiram barrar esses desgastes em camundongos tratados com restrição calórica - estes viveram 40% mais do que os superalimentados.
SAIA DO SEDENTARISMO: a partir dessa atitude, você emagrece, aumenta a força muscular, melhora a capacidade respiratória e, conseqüentemente, previne ou controla diversas doenças. Sozinha, a atividade física não garante a longevidade, mas certamente fortalece o organismo e colabora para elevar a expectativa média de vida de uma população.
AFASTE O ESTRESSE: quem vive tenso produz mais radicais livres, substâncias tóxicas responsáveis pela maioria dos sinais de envelhecimento, incluindo catarata, cabelo grisalho, pele seca, rugas e alguns tipos de câncer. O estresse também pode afetar os telômeros. Pesquisa da Universidade da Califórnia (EUA) demonstrou que mulheres no período anterior à menopausa, sob fortes tensões emocionais, apresentam um encurtamento dessas estruturas e podem envelhecer, em média, 10 anos a mais do que as calminhas.
MANTENHA O OTIMISMO: o escritor francês Honoré de Balzac já dizia que "o homem começa a morrer na idade em que perde o entusiasmo". Pesquisa recente realizada pela Universidade do Texas (EUA), com as 1.558 pessoas mais velhas da comunidade, demonstrou haver uma forte ligação entre emoções positivas e o estado de saúde. Após sete anos de avaliações, constatou-se que os idosos mais otimistas tinham uma probabilidade menor de desenvolver problemas físicos, como exaustão e falta de força ou velocidade para caminhar.
EXERCITE O CÉREBRO: vale ler, estudar, escrever, aprender um idioma, navegar pela Internet, dançar, cuidar de plantas e até cozinhar. O risco de um idoso ativo desenvolver diversos tipos de demência, entre elas o mal de Alzheimer, é duas vezes menor em comparação com os velhinhos mais apáticos.
TENHA FÉ: existem pelo menos 250 estudos indicando que pessoas que têm um tipo de vínculo religioso ou prática espiritual - o que quase sempre inclui orações - são mais saudáveis em todos os aspectos, quando comparadas àquelas não-adeptas a qualquer forma de religiosidade. A longevidade é, em média, 10% maior entre os que professam alguma fé.