O que são as carências afetivas segundo a psicologia
Por Sara Sanchis, Psicóloga especializada em Crescimento Pessoal
O que são as carências afetivas segundo a psicologia
As carências afetivas são as consequências devastadoras de uma privação afetiva de uma criança durante sua primeira infância, isto é, uma falta de afeto ou de carinho. Este período é fundamental no ser humano para estabelecer as bases (de segurança ou insegurança) sobra as quais desenvolverá e construirá, posteriormente, seu projeto de vida.
O desenvolvimento ótimo e saudável das pessoas requer um cuidado e uma atenção afetivo-emocional positiva durante a primeira infância. Nos casos em que isto não ocorre como deveria (por incapacidade parental, por doença grave, por separação, etc.), é possível que se instaure no interior da pessoa a sensação de carência afetiva ou falta de carinho, experiência que a condicionará muito negativamente em quase todos os âmbitos de sua vida, se a situação não for revertida a tempo. A mãe (ou figura materna substitua) e a família são as principais figuras responsáveis pelo cuidado afetivo das crianças durante sua primeira infância. Em grande medida, encontra-se em suas mãos o estabelecimento de bases emocionais seguras, instáveis ou insuficientes nas crianças.
Tipos de carência afetiva
A carência afetiva surge durante a primeira infância, como já mencionamos, mas suas manifestações podem se dar ao longo de toda a vida. Quanto mais cedo se manifestar e ser percebida e tratada, melhor será o resultado do tratamento.
Carência afetiva em crianças
Muitas vezes a carência afetiva já se manifesta nos primeiros anos, de três formas possíveis:
- Como uma resposta de demanda afetiva contínua: são crianças dependentes que buscam continuamente estar acompanhadas e cuja autoestima depende da avaliação dos outros; precisam, em muitos casos, ser o centro da atenção para se sentirem valorizadas; se frustram e se irritam quando não são atendidas como acreditam merecer e precisar; etc.
- Como uma resposta de agressão, oposição e rejeição: exteriorizam sua dor interna sobre os outros (a mãe ou outras pessoas) e sobre o entorno através de um comportamento destrutivo: comportamento antissocial, desafiador, insubmisso, agressivo, autoritário, etc.
- Com uma resposta de indiferença e falta de interesse: nestes casos, a criança se isola e se esconde dentro de si mesma. De certa forma, se desconecta do entorno para deixar de sofrer. Nestes casos, as crianças geralmente são passivas ou inativas; com grande desenvolvimento da imaginação, muito observadoras e analíticas; pouco comunicativas ou expressivas; com grandes dificuldades para as interações sociais; etc.
Carência afetiva em adolescentes
Se a pessoa com carência afetiva passou pela infância de uma maneira mais ou menos "normal", é possível que durante a adolescência todo este mal-estar interno estoure. Os comportamentos mais frequentes entre os adolescentes que passaram por estas experiências são:
- Comportamento sexual precoce, inconsciente e de risco, com gravidez e possíveis abortos em meninas, como consequência deste comportamento sexual imaturo.
- Comportamento antissocial, agressivo, dominante e, de novo, de risco, existindo uma alta probabilidade de praticar delinquências, como meio de escape emocional.
- Comportamento de medo e submissão, com o consequente isolamento social.
- Vícios (álcool, drogas, esportes perigosos, etc.) como meio de descarga fisiológica e emocional.
- Comportamentos de maltrato contra os próprios pais, contra o/a namorado/a, contra desconhecidos, etc.
Carência afetiva em adultos
A carência afetiva infantil, se não detectada e tratada a tempo, se manifesta na idade adulta, limitando a pessoa em muitos aspectos de sua vida. Desta forma, e como falamos até agora, o adulto com carências afetivas se comportará com um destes três estilos comportamentais predominantes (ou com a combinação de vários):
- Estilo agressivo, pouco empático, autoritário e antissocial;
- Estilo dependente, controlador, ciumento, controlador, etc;
- Estilo medroso, submisso, com contato social escasso, muito imaginativo, com características e interesses peculiares, etc.
Carência afetiva paterna ou materna
Toda carência afetiva provém de um cuidado emocional insuficiente ou ineficaz durante a primeira infância. A gravidade das consequências e a dificuldade para superar esta carência dependerá de vários fatores:
- O momento de início da experiência;
- O tempo de duração;
- A intensidade da negligência.
Quanto mais cedo se inicie a experiência de não atenção/separação, quanto mais dure e quanto mais intensa for, mais negativas serão as consequências e mais complicada de ser resolvida. No entanto, isto nunca deve ser motivo para deixar de intervir.
Carência afetiva no relacionamento
A manifestação da carência afetiva no relacionamento pode ser resultado de uma carência afetiva em um dos membros do casal, ou em ambos.
- Em muitos casos, pessoas com carências afetivas estabelecem relacionamentos, mas são incapazes de mostrar seu afeto pelas limitações pessoais que vivenciaram em suas experiências na infância.
- Em outros casos, a carência afetiva ou falta de carinho se manifesta em uma relação obsessiva, de dependência, de controle e de ciúmes em relação ao companheiro/a, precisamente por causa de sua própria privação afetiva na infância.
- Em um terceiro caso, a pessoa com privação emocional irá tratar seu/sua companheiro/a de forma agressiva, desrespeitosa e pouco afetiva.
Não é incomum ver como a combinação destes perfis de pessoas constituem casais:
- O perfil agressivo com o dependente: nestes casos existem altas probabilidades de que ocorram situações de maltrato.
- O perfil passivo com o dependente: nestes casos, a pessoa dependente acaba frustrada com a ausência de seu/sua companheiro/a.
Consequências da carência afetiva
A falta de afeto familiar tem consequências? Sim, as pessoas que são vítimas da carência afetiva desenvolvem um perfil imaturo que cede espaço a desvios de comportamento e dificuldade de aprendizagem. De forma geral, podemos nomear como consequências da carência afetiva ou falta de carinho, as seguintes:
- Transtornos emocionais: irritabilidade ou agressividade, instabilidade emocional, baixa autoestima, ansiedade, depressão, pensamentos suicidas, distorção cognitiva da realidade, etc.
- Transtornos comportamentais: comportamento antissocial, retraimento, falta de assertividade, ressentimento, desobediência, falta de cooperação, insubmissão ou submissão, dependência, comportamento instável, etc.
- Transtornos psicossomáticos: deterioramento ou imaturidade no desenvolvimento e crescimento, regressões; propensão a quedas e acidentes; alteração do esquema corporal; etc.
- Transtornos cognitivos: déficit de atenção, hiperatividade, falta de concentração, baixo rendimento escolar, dificuldade para processar a informação, etc.
Tratamento para a síndrome de carência afetiva em adultos
Quando uma pessoa com carência afetiva chega a sua vida adulta sem ter recebido nenhum tipo de ajuda, as consequências sobre sua pessoa podem ter gerado grandes danos. No entanto, sempre é possível reverter a situação e para isso será necessário que o tratamento permita, entre outras coisas:
- Buscar a origem de sua carência afetiva (normalmente, localizada no ambiente familiar) e tomar consciência da dor que isto provocou. Isto requer um acompanhamento afetivo e respeitoso por parte do/da terapeuta, o que permitirá a pessoa exteriorizar a dor vivida e controlá-la, como não havia sido no momento em que ocorreu.
- Após este primeiro passo, é necessário ir desconstruindo toda sua personalidade para comprovar de que forma esta carência afetiva e a dor que ela gerou, modelaram todas suas crenças sobre si mesmo, sobre os outros e sobre o mundo, suas emoções e, consequentemente, seus comportamentos.
- Esta tomada de consciência junto com a afirmação do terapeuta de que sua pessoa real tem um grande potencial que foi limitado pelo personagem que foi aceito e interiorizado sobre si mesmo, dará a motivação necessária para empreender as mudanças necessárias.
- Iniciar um trabalho de reestruturação cognitiva, abandonando todos os pensamentos negativos e absurdos e despertando seu verdadeiro potencial, desenvolvendo o hábito de escutar a si mesmo, a sua própria intuição.
- Reafirmar-se no ser que está nascendo e que é você de verdade.
- Durante todo o processo, podemos utilizar também o trabalho corporal de respirações e relaxamentos, etc. já que muito do psicológico e emocional fica ancorado no corpo. Trabalhar isto é uma ferramenta básica para abrir parte dos bloqueios emocionais e não permitir que voltem a se instalar.
Para realizar todo este trabalho o paciente precisa ter paciência, constância e coragem. Não é um processo simples, nem rápido, mas as soluções definitivas requerem um trabalho completo e elaborado.
- Bielsa, A. Carencia afectiva. Centre Londres 94. Equip d'atenció per al desenvolupament i millora de la familia.
- González, E. Educar en la afectividad. Facultad de Educación. Universidad Complutense de Madrid.