Amor é arte, não entretenimento

19/02/2015 13:48
estacaodasflores |

Um um relacionamento amoroso, sempre mostre para a pessoa que ela pode te perder a qualquer momento”. Sempre escuto essa frase e fico pensando como alguém ainda acredita nisso. A resposta é simples: Qualquer pessoa pode perder a outra a qualquer momento. Seja por uma morte, por causa de uma viagem ou simplesmente porque talvez a pessoa não goste mais da sua companhia.
Nos inspiramos em comédias românticas e a achamos que a nossa vida pode se parecer com a de um filme, esquecendo que as pessoas são muito mais complexas do que se mostram. Aprendemos a nos relacionar como se faz um bolo de chocolate e foram dadas regras para se jogar um jogo que não tem ganhador. Por isso, andamos tão frustrados e sem entender o que as pessoas querem, porque se elas saem do ‘padrão’ de comportamento esperado, a gente se desespera. Zygmunt Bauman tratou disso muito bem quando escreveu o livro “O Amor líquido”, onde ele compara essa fluidez dos relacionamentos de hoje com o comportamento da sociedade. Rapidez e utilidade são as características mais marcantes no momento e infelizmente as pessoas começaram a aplicar essas fórmulas nas relações.
Depois da Revolução Industrial, com o advento da propaganda e do marketing e todas as estratégias para vender produtos, o mundo virou de cabeça para baixo, por não saber direito o que fazer com tanto produto pra ser vendido. A cultura de massa foi muito bem instalada, ao ponto de que tudo virou massificado e superficial, inclusive os relacionamentos, que passaram a ser uma espécie de entretenimento. As estratégias de venda foram aos poucos se inserindo na nossa vida pessoal e então passamos a acreditar que também éramos um produto e conseguiríamos ser “vendidos” se tivéssemos uma boa estratégia.
Não pode demonstrar que gosta demais, nem ligar no dia seguinte, senão vamos parecer desesperados. Precisamos nos dar sempre pela metade, senão assusta. As pessoas forçam para que seus parceiros continuem ali, criando métodos para deixá-los sempre presos. A gente provoca, se dá um pouquinho, mas depois tira. Nós não somos ações na bolsa, nem contratos e muito menos donos um dos outros. Todo mundo gosta muito de brincar com o desejo do outro, porque nos falaram que as pessoas gostam de desafio. Criamos essa ideia de que tudo que é mais difícil vale mais a pena, mas o amor não cabe nessa teoria. O amor é simples e não precisa de dificuldade para nascer. O desafio já consiste em se relacionar, porque quando se trata de gente, nós nunca sabemos nada e mais uma vez nos encontramos à beira de um abismo.
O amor se aproxima da arte porque, nos dois casos, nos encontraremos perdidos, em algum momento, em frente a uma página em branco. Quando temos todas as possibilidades, nos assustamos porque não sabemos lidar com o infinito. Temos que largar o nosso orgulho de lado para olharmos para nós mesmos e finalmente darmos o primeiro passo, a primeira palavra, o primeiro risco. Nunca sabemos o que vai fazer com que o outro se apaixone ou se desapaixone, porque, às vezes, nem ele mesmo sabe. Então eu não sei para quê criar mais mistério, se por mais aberta que seja uma pessoa, ela vai ser sempre um mistério para o outro. Ou pelo menos, deveria ser.
Não existe um modo de definir ou enquadrar relacionamentos, porque as pessoas são diferentes e cada pessoa é um infinito de possibilidades. Cada ser é um pequeno universo que se cria e transforma todos os dias. Não existem regras, só entrega e descoberta. No dia que entendermos isso de fato, estaremos realmente preparados para amar e para entender os altos e baixos do outro. No amor não existe o certo, só existe o risco.