AMIZADE SÓ FAZ BEM

31/01/2012 22:14


Recentes estudos confirmam: viver sozinho é prejudicial à saúde, principalmente à do coração. Para evitar os danos, psicólogos ensinam o que fazer para viver rodeado de amigo
 

 

Vivemos um tempo no qual tudo nos convida a estarmos sós. Os livros são de auto-ajuda, os restaurantes são do tipo self-service, o mercado imobiliário se especializa em imóveis para pessoas que optaram por morar sozinhas, e até as embalagens dos produtos têm sido idealizadas para aqueles que nunca estão acompanhados. Viver só não é um problema em nossa sociedade, mas sinal de que alcançamos independência, auto-estima e suficiência.

Embora aprender a estar consigo mesmo e apreciar essa condição sem sofrimento seja uma meta ideal, o outro lado da questão faz pensar em quão difícil tem sido construir relações ricas e duradouras, não só do ponto de vista romântico, mas também social. Além disso, estudos indicam que permanecer isolado socialmente pode acarretar alterações significativas em nossa saúde, pois essa condição tem sido relacionada à depressão, diminuição do sono e da capacidade cognitiva, doença de Alzheimer e até mortalidade.

A solidão está também associada ao aumento da pressão sanguínea, das atividades do hipotálamo, da glândula pituitária e do córtex adrenal (vinculados ao hormônio do estresse, o cortisol), alterações no sistema imunológico, arteriosclerose, diabetes, inflamações e contrações nos vasos sanguíneos. Não bastasse esse extenso elenco, alcoolismo, sedentarismo e obesidade aparecem igualmente na lista dos males de quem vive só.

Uma pesquisa realizada por Louise Hawkley, diretora e pesquisadora do Laboratório de Neurociência Social, do departamento de Psicologia da Universidade de Chicago, nos EUA, mostrou que o remédio para prevenir essas enfermidades é manter um círculo de amizades ou estar inserido em algum grupo social.

A psicóloga diz que “ter muitas amizades não é necessariamente mais benéfico do que possuir apenas um bom amigo. O que verificamos em nosso estudo sobre a solidão é que um bom casamento, ter um ou mais amigos ou pertencer a um grupo significativo contribuem para a sensação de estar socialmente conectado. Esses são os tipos de relações que estão associados à boa saúde”, esclarece aos leitores de VivaSaúde, em entrevista exclusiva.

Louise lembra que cada pessoa difere em suas necessidades e, por isso, alguns indivíduos precisarão apenas de um amigo para se sentirem satisfeitos. Outros estarão mais à vontade se puderem contar com um número maior de amizades. Indagada se esse comportamento pode variar entre homens e mulheres, a pesquisadora explica que sua investigação não apresentou diferenças de gênero quanto à solidão. Contudo, ressalta, “os homens dão menos importância à questão do que as mulheres”.

 

"TER MUITAS AMIZADES NÃO É NECESSARIAMENTE MAIS BENÉFICO DO QUE POSSUIR APENAS UM BOM AMIGO. O MAIS IMPORTANTE É SENTIR-SE SOCIALMENTE CONECTADO"
LOUISE HAWKLEY, PESQUISADORA DA UNIVERSIDADE DE CHICAGO

É fácil não ser só

A arte imita a vida e o órgão que mais sofre com a solidão é o coração. Viver só é condição de risco que leva à resistência da circulação sanguínea do sistema cardiovascular, causada por inflamações decorrentes do excesso de cortisol no organismo. Louise sugere, então, algumas ações preventivas para se manter longe das doenças. Ela cita uma fórmula concebida por um de seus colaboradores, John Cacioppo, autor do livro Loneliness – human nature and the need for social connection [“Solidão, a natureza humana e a necessidade de conexão social”, ed. Norton, sem tradução para o português]

O pesquisador sintetizou uma série de atitudes por meio de um acrônimo: EASE [fácil]: E, de Expose [expor-se]; A, de Action Plan [plano de ação]; S, de Selection [seleção] e E, de Expect the best [esperar o melhor].

O primeiro passo rumo às amizades é expor-se, aumentando nossa participação em eventos sociais: “Procure encontrar um jeito de se relacionar com outras pessoas, talvez tomando a iniciativa de oferecer ao outro um gesto ou uma palavra gentil, quem sabe por meio de um trabalho voluntário, como ler um livro para cegos”. A psicóloga acrescenta que essa atitude pode não levar necessariamente a uma amizade a longo prazo, “mas traz sensação de bem-estar pelo simples fato de se estar com outras pessoas”.

O passo seguinte é desenvolver um plano de ação: saber que tipo de amizades você deseja e, só então, projetar como fará para chegar até elas. “Isso inclui pensar sobre os tipos de problemas ocorridos no passado com suas amizades, procurando aprender (talvez com a ajuda de um consultor treinado), formas de evitar essas dificuldades no futuro”, diz Louise. “Isso significa ser honesto consigo mesmo sobre as mudanças pessoais que devem ser feitas, tentando ser positivo e abrindo-se aos outros, estando pronto para recomeçar, caso não se obtenha sucesso na primeira vez”, conclui.

O terceiro passo é selecionar os amigos cuidadosamente. “A melhor forma de aliviar a solidão é com o apoio de amizades de qualidade, não com um vasto número de amigos superficiais”, pondera a psicóloga. “Você terá mais sucesso se procurar por alguém que possua crenças semelhantes às suas e esteja no mesmo estágio da vida que o seu.” A quarta e última ação é esperar o melhor. Louise fala que, se esperamos nada além do melhor, é exatamente isso que teremos. “Uma atitude positiva, paciência, e um espírito generoso trarão os outros até você e aumentarão suas expectativas positivas.”

 

Faça contato

Colocadas em prática essas novas estratégias, quanto tempo deve-se esperar para obter resultados benéficos? A psicóloga americana responde que isso depende de como anda a saúde de cada pessoa. Seus estudos indicaram que os genes não são estáticos. Aqueles que não mantêm uma vida social saudável despertam dentro de si genes que provocam inflamações na mesma proporção que reduzem os que deveriam combatê-las. Indivíduos integrados socialmente têm maior chance de evitar o desencadeamento desse processo.

E exemplifica: “Pessoas solitárias estão no grupo de risco da depressão. Reduzir os sentimentos de solidão pode ajudar rapidamente a diminuir os sintomas correlatos. Porém, no caso de pessoas solitárias e com pressão alta, por terem vivido nessa situação por muito tempo, às vezes é muito tarde para voltar aos níveis originais”.

Conforme Louise, essa é uma das razões pelas quais as mudanças psicológicas podem levar algum tempo para ter o efeito desejado: “Em nosso modelo teórico de solidão, pensamos que, quando a situação é crônica, há uma aceleração do típico declínio psicológico relacionado à idade. Isso é inevitável, mas a porcentagem de pessoas que perderam sua capacidade de recuperar o vigor psicológico é maior entre as pessoas solitárias que nas não solitárias”. De todo modo, afirma, “é melhor lutar contra a solidão e buscar o contato com outras pessoas”.

 

Pessoas com uma boa rede de amigos e confidentes vivem 22% mais tempo do que aqueles que se isolam

Amigos e longevidade

Outro estudo realizado na Austrália confirma as conclusões da pesquisadora americana. O levantamento foi realizado pelo Centro do Envelhecimento da Universidade de Flinders (Adelaide), onde se concluiu que ter amigos está ligado à longevidade: pessoas com uma boa rede de amigos e confidentes vivem 22% mais tempo do que aqueles que se isolam.

A pesquisa australiana revelou que a família é importante, mas sua influência para a saúde não é tão grande como a dos amigos. A explicação para isso estaria no fato de que são eles nossos maiores incentivadores para nos cuidarmos melhor, parar de fumar ou beber e procurar ajuda médica diante de algum sinal físico importante. Além disso, são os amigos que estão por perto para ouvir e ajudar a enfrentar os momentos difíceis, muitas vezes vividos dentro da própria família.

Ainda segundo o estudo, pouco importa se é uma amizade de longa data ou não. A mensagem central é que manter um senso de sociabilidade entre amigos aparece como fator relevante à sobrevivência.

Para além dos efeitos na saúde, outro aspecto a ser considerado são os sintomas psicossociais decorrentes da solidão. Alguém que viva só pode sentir- se excluído, e essa sensação se exterioriza em forma de tristeza, estresse, ansiedade, raiva, medo, negativismo, baixa auto-estima e percepção de pouco apoio social.

Frio da solidão

A respeito desses sentimentos, uma recente pesquisa realizada na Universidade de Toronto e publicada na revista Psychological Science concluiu que as metáforas relativas à solidão, ligadas ao frio, correspondem à realidade dos fatos. Pessoas que se sentem excluídas sentem mais frio porque sentir-se só altera a capacidade de percepção de calor.

Na opinião do médico, sociólogo e psicoterapeuta italiano Francesco Alberoni, autor do livro A amizade (Ed. Rocco), esse fenômeno acontece porque ter amigos é uma necessidade humana que nos acompanha por toda a vida e se manifesta nos primeiros anos na infância.

Para o escritor, quando nos apaixonamos por alguém, sabemos que estamos correndo um risco. No caso das amizades, iniciamos o percurso atentos aos princípios da realidade e da reciprocidade: “Nós nos tornamos amigos de quem se demonstra amigo. A amizade não se baseia somente na simpatia, mas também na confiança. O amigo é aquele em quem você pode confiar. Porém, é preciso fazer uma distinção: amizade entre companheiros e colegas e amizade verdadeira. Podemos ter muitas amizades, mas somente poucos amigos verdadeiros”. Estes seriam aqueles que nunca nos entendem mal e são capazes de transmitir aquela sensação de calor humano, que só a certeza de que temos com quem contar pode nos dar.

Para aqueles que desejam construir laços de amizade, mas não sabem como fazê-lo, o sociólogo italiano aconselha tranqüilidade e otimismo: “Devemos pedir aos outros aquilo que desejamos e perguntar a eles o que esperam de nós”. “A via mais simples é sempre aquela mais direta. Vale na relação com os colegas, entre amigos e até entre os casais”, completa.

 

6 DICAS PARA SER UM BOM AMIGO
1 Passe mais tempo juntos. se você não pode participar das caminhadas, nem da ioga, telefone ou escreva um e-mail. as conversas não precisam ser longas e pessoais. esses pequenos momentos de “eu pensei em você!” podem construir uma forte rede de relações.
2 Faça dos amigos uma prioridade. Talvez você devesse limpar a casa, lavar o cachorro, ir ao mercado, ou ver Tv (algumas pessoas pensam que precisam fazer isso!). você terá muito tempo para seus deveres quando morrer... Por ora, pense nos benefícios da amizade.
3 Esteja por perto na saúde e na doença. apareça em funerais e casamentos, cirurgias e celebrações. seja sinceramente triste ou genuinamente alegre para com seu amigo. e inclua-o no bom e no não-tão-bom de sua vida. Um bom jeito de ser um bom amigo é incluir as pessoas.
4 Não entre numa competição. Quem ligou por último? Quem gastou mais com os presentes de Natal? Quem se importa? se você tem um bom amigo, relaxe! se a amizade não é o máximo, talvez seja o momento de reavaliá-la. Os benefícios das amizades duram mais do que uma contagem de pontos.
5 Preste atenção nas pequenas coisas. as conversas que mais importam são aquelas que duram apenas alguns instantes. Não são apenas as longas conversas que mantêm os amigos unidos. são as pequenas coisas cotidianas. Um jeito de ser um bom amigo é ter conversas curtas e doces.
6 Veja as coisas positivas. Todos nós temos fraquezas e defeitos. Concentrar-se no lado bom de seus amigos manterá a amizade viva e forte. Para ser um bom amigo, esqueça das coisas que você gostaria que fossem diferentes.