A palavra certa na hora certa
Conheça as histórias de quem mudou de idéia ou de atitude depois de uma boa conversa. E aprenda a dizer - e a ouvir - coisas difíceis
Você tem medo de quê?" A pergunta de um amigo ficou dias martelando na cabeça da repórter Ana Paula Barros, 31 anos. "Fui desabafar com ele porque meu marido estava distante e eu não sabia mais o que fazer para mantê-lo perto de mim", conta. Com o questionamento do amigo, a ficha caiu. "Percebi que eu tinha medo de sofrer, mas, ironicamente, sofrer era o que mais fazia nos últimos tempos tentando sustentar sozinha o meu casamento." A partir daí, começou a ver saída. Encarou o problema, definiu a separação com o marido e desatou o nó da garganta. Trocando em miúdos, ela teve a sorte de ouvir a palavra certa na hora certa.
Segundo Tuto de Paula Souza, doutor em psicologia clínica, fonoaudiólogo e professor da PUC de São Paulo, "a palavra certeira é ativa, traz novidades e gera transformações, sejam elas boas ou más, grandiosas ou sutis". É justamente por isso que às vezes silenciamos ou adiamos conversas. Afinal, mudar quase sempre significa vencer resistências e implica em grande trabalho interior.
A palavra certa é verdadeira
Além de gerar mudanças, a palavra certa corresponde a uma emoção genuína de quem se expressa. "Não é necessário, de forma alguma, ter o dom da oratória ou talento literário para fazer dela uma aliada, o que importa é conectá-la com seu íntimo", diz Paula Souza. Ele sugere uma solução aparentemente simples para quem deseja recuperar o poder da fala: expor-se. "Diga o que você sente e pensa. Não precisa ser só em situações grandiosas, comece no cotidiano, com coisas simples", explica. Por exemplo: você chega em casa exausta, depois de um dia de trabalho duro, e seu filho a requisita para brincar ou mostrar a lição. Pressionada, cede, mas não presta atenção nem fica totalmente presente. É preferível soltar um prosaico "agora não" do que ficar enrolando - mesmo que venha a frustrar a criança. "É muito mais saudável um não de verdade do que um sim de mentira", assegura o professor. No livro O Significado da Vida, de Richard Edler (Alegro), um relato autobiográfico, um rapaz que perdeu o irmão ensina: "Você não pode dizer 'Sei como você se sente' se nunca passou por aquilo e não sabe. Em vez disso, é melhor dizer apenas: 'Se precisar de mim, estou aqui' ". Ou seja, a fala vazia de emoção não conforta, muito pelo contrário, choca pela falta de sentido.
A palavra certa é oportuna
Para ajudar, não basta ter tudo na ponta da língua, deve-se levar em consideração o momento do outro. No caso da estudante Lidiane Monte de Oliveira, 23 anos, o desafio que sua irmã lançou chegou na hora exata. Lidiane estava doente e deprimida às vésperas de uma internação hospitalar quando a irmã disparou a citação de um livro que exprimia o que pensava: "Isto aqui não é um ensaio geral. É a sua vida. Não desista dela". A frase ressuscitou o ânimo da estudante. Em algumas situações, por estranho que pareça, o silêncio é mais oportuno. A escritora Jamie Sams, em seu novo livro, Dançando os Sonhos - Os Sete Caminhos Sagrados da Transformação Humana (Rocco), revela que, em culturas indígenas do mundo todo, o hábito de trabalhar em silêncio ou cantando tem a função de evitar papo-furado e mexericos. "A compreensão de que todas as palavras refletem e criam energia positiva e negativa impede a tagarelice nas tribos", explica Jamie.
A palavra certa é amorosa
A fala pode ser usada para ensinar, acalentar, alimentar a cumplicidade e criar vínculos entre as pessoas, e essa força se potencializa quando refinamos a sensibilidade para achar o tom. A vendedora Sheila Cristina Suriano, 19 anos, conta que sua mãe conseguiu recomendar uma dieta sem magoá-la, em um período em que ela se arrastava, com a auto-estima baixíssima, por causa de um fora do namorado. "Eu achava que o problema era o meu corpo, mas não conversava sobre isso com ninguém porque tinha medo de que as pessoas confirmassem que eu estava gorda e feia", lembra. Vendo seu sofrimento, a mãe foi direto ao ponto: "Você é bonita e deve se valorizar. Se o problema é o excesso de peso, por que não tomar uma atitude em vez de ficar chorando?" Sentindo-se apoiada, Sheila nem precisou de remédios ou academia. "Simplesmente fechei a boca e emagreci quase 30 quilos em um ano." Paula Souza reafirma que é a generosidade que diferencia a fala educada, que é fria, da fala amorosa, que é quente e vibrante. "Não adianta só dizer a verdade, é preciso ofertá-la e fazer dela alguma coisa preciosa para a relação entre as pessoas."
Como dizer coisas difíceis...
A terapeuta familiar Maria Rita D'Angelo orienta:
Não julgue - Em uma situação de saia-justa, procure evitar frases que contenham críticas embutidas, tais como: "Você precisa aprender a respeitar o outro". Nas entrelinhas, está acusando seu interlocutor e vai deixá-lo em guarda.
Expresse sua mágoa - Se você ficou ofendida, calar bloqueará sua comunicação. Portanto, abra-se. Às vezes, a gente teme que as queixas levem a brigas ou rupturas. Aí, é hora de avaliar se quer permanecer em uma relação em que seu sentimento não é levado em conta.
Diga não - Quem sempre diz sim ao outro acaba dizendo não a si própria e se prejudicando.
Evite o tom professoral - Se uma amiga está mal porque brigou com o marido, faça ponderações que estimulem sua reflexão em vez de tentar dar-lhe uma lição.
Pense antes de falar - Todas as coisas difíceis podem ser ditas desde que não sejam expressas com raiva. Se estiver furiosa, adie o papo.


