Essa teoria surgiu depois que a aluna Maureen Murdock, percebeu em 1990 que a Jornada do Herói não se encaixava na jornada da mulher contemporânea. Mesmo que, em alguns casos conseguisse contar a história de protagonistas femininas, não estava alinhada com a busca psicológica e espiritual das mulheres atuais. Foi então que ela publicou seu livro, "A Jornada da Heroína" que explora um novo modelo de narrativa que explora as necessidades, dilemas e angústias da mulher moderna e não do homem.
Na época, Joseph Campbell, criador da Jornada do Herói, disse não concordar com a versão de Murdock. Para ele, a mulher ocupa um lugar de destaque na jornada do herói, sendo a grande recompensa para o protagonista. Mas para Maureen, o modelo de Campbell contempla a jornada do herói que busca a reconexão consigo mesmo, mas não a de um personagem, masculino ou feminino, com uma procura mais psicológica que espiritual.
O que eu achei mais legal, é que a Jornada da Heroína não é o contrário da famosa Jornada do Herói, mas sim uma outra forma de construir a história, de forma que o trajeto das mulheres seja melhor representado. Sem impedir que os dois modelos apareçam na mesma história.
Murdock explica que os aspectos sociais e culturais criam diferenças psicológicas entre os gêneros e por isso ela defendia a necessidade de um novo modelo de mito para as mulheres.
Mas o que é a jornada da heroína? Acho que um exemplo de narrativa que trás a Jornada da Heroína é a animação da Disney, Mulan e por isso vou tentar usar o filme como exemplo para cada um dos 8 passos.
1. Troca do feminino pelo masculino.
Em alguns textos, esse passo pode ser separado em dois, "A Negação do Feminino" e a "Identificação com o Masculino". Que é quando a heroína se identifica com um modelo masculino e nega o resto, a feminilidade e até a figura materna.
Na animação, podemos ver como Mulan aceita o papel de um homem, seu pai, para poder ir para a guerra. E ao fazer isso, renuncia seu papel feminino e incorpora o masculino.
2. A estrada das Provações ou Caminho das Provas
Esse caminho das provas trata sobre lidar com os problemas impostos pelo mundo patriarcal, sejam obstáculos místicos ou até relacionamentos que não dão certo.
Essa parte se encaixa um pouco menos, mas durante seu treinamento, Mulan consegue superar as dificuldades que teria no treinamento por ser uma mulher. E consegue se tornar uma boa guerreira junto com seus amigos.
3. A ilusão do sucesso.
Nesse momento a heroína tem tudo, alcançou suas metas, é respeitada, líder, sagaz e competente. Mas continua sentindo que não é suficiente, mesmo com o aparente sucesso, ela não recebe a recompensa. É aquele momento em que ela percebe que para se encaixar como mulher, tem que ser muito mais competente que um homem.
Quando termina seu treinamento, Mulan dá de cara com uma vila destruída pelos Hunos. É nesse momento que a heroína não recebe sua recompensa. Apesar de ser um bom soldado, ela não é suficiente para proteger aquelas pessoas. E é então que sua identidade é descoberta e Mulan volta a ser vista como mulher
4. A descida.
O momento em que a heroína aprende a dizer não e para de se apagar como fazia antes. Esse é o momento que a jornada da heroína abandona a parte masculina e entra na parte feminina.
Nessa hora que Mulan persiste mesmo depois de ser expulsa do exército e deixada para trás. Ela aceita sua parte feminina e decide continuar combatendo os Hunos.
5. A Iniciação
Nesse momento a heroína deixa de procurar se encaixar no mundo patriarcal e começa a se reconectar com o feminino que foi negado anteriormente. Um caminho de despertar, para procurar a mudança na cultura e na sociedade.
Bom, esse momento de reconexão com o feminino fica um pouco caricato na história, quando até mesmo os outros soldados precisam se vestir como mulheres para conseguirem entrar no palácio. Mas se a gente esticar um pouquinho a metáfora aqui, Mulan se reafirma como mulher e deixa de se omitir, confiando nos próprios instintos e também mostrando aos companheiros que o feminino também tem poder.
6. Reconciliação com o Feminino.
É o ponto no qual é preciso entender o ponto negativo do feminino e o que precisa ser integrado na vida da mulher.
7. (Re)incorporação do masculino.
Nesse momento a heroína precisa reconhecer seu masculino interno e entender que não é preciso ser perfeita, para ser competitiva. É se tornar consciente disso e deixar ir.
8. A União.
O ultimo ponto é a união, que busca equilibrar o lado masculino e feminino.
Os passos, 6, 7 e 8 eu acredito que se encaixam no finalzinho do filme, quando Mulan volta para a casa, depois de recusar o posto como conselheira do Imperador e aceita seu lado guerreira, ao mesmo tempo que abraça o feminino em seu início de relacionamento com o Shang.
Basicamente é essa a jornada da heroína, que, apesar de encontrar em seu último passo na União, é representada como cíclica. O que mais me chama atenção na Jornada da Heroína é a relação com o feminino que a personagem tem que enfrentar.
Claro que, essas noções mitológicas do Herói e a Heroína não se aplicam somente à escrita, mas são conceitos da psicologia que são aplicados às histórias. Você conhece algum outro exemplo da Jornada da Heroína? Concorda com os paralelos que fiz sobre o filme da Disney? Deixe seu comentário e vamos conversar sobre isso!